Ascensão do Inimigo

A Guerra da Lança tinha chegado ao seu fim, grandes cavaleiros se sacrificaram para manter a paz, mas o exército maligno não tinha sido derrotado totalmente. Em sua poderosa fortaleza a Dama Azul ainda planejava um último ataque de sua Armada Dracônica aos Reinos de Solamnia. No entanto, um mal muito mais antigo foi despertado sem o conhecimento de nenhum dos lados. Um inimigo incrivelmente poderoso que usa sutilmente sua influência sombria para alcançar seus objetivos. Cabe a um grupo de bravos heróis confrontar esse perigo avassalador que a todos domina. O Sussurro das Trevas é um épico de fantasia dividido em três partes que narrará uma saga no mundo de Dragonlance.

Poema dos Seis Heróis

“A palavra será a redenção dos pecadores
Apenas o mais misericordioso a portará
O Mal rastejará novamente para as profundezas

O escudo será a proteção dos desamparados
Apenas o mais honrado o portará
O Mal rastejará novamente para as profundezas

A espada será a justiça dos oprimidos
Apenas o mais temerário a portará
O Mal rastejará novamente para as profundezas

O cajado será a lei dos desesperados
Apenas o mais prudente o portará
O Mal rastejará novamente para as profundezas

A flecha será o equilíbrio dos soberbos
Apenas o mais sábio a portará
O Mal rastejará novamente para as profundezas

O machado será a vingança dos esquecidos
Apenas o mais audacioso o portará
O Mal rastejará novamente para as profundezas”

sábado, 8 de maio de 2010

Capítulo I - O Antigo é Libertado

A chuva castigava ruidosamente sobre as planícies de Solamnia. Como vocês bem sabem, era assim no quarto mês do ano, dedicado a Deusa da Natureza Chislev. No entanto, eles nada percebiam. Montados em uma enorme Dragoa Azul, que além deles também levava uma estranha jaula coberta, os dois homens voavam por cima da chuva, rasgando nuvens carregadas.
Um deles usava uma resistente armadura de escamas de dragão azul, símbolo dos Senhores dos Dragões. Tinha uma capa azul escura por fora, mas vermelha por dentro. Uma espada longa estava presa a sua cintura, uma arma perversa que contarei sua história depois. Além disso, trazia consigo uma cruel lança de montaria grande o suficiente para ser usada em combate aéreo com um dragão, mas longe da eficácia das Lanças do Dragão.
O outro usava mantos negros e capuz que cobriam seu rosto. Havia várias inscrições mágicas em seu manto, mas só podiam ser vistas por alguém capaz de ver emanações mágicas, um dom raro aos não magos. Como arma portava apenas um cajado com o crânio de alguma desconhecida criatura na ponta. Algumas penas e assas de morcego estavam presas ao cajado. Suas unhas das mãos eram grandes como as de um animal e o fazia segurar de forma desajeitada sua única arma visível.
Partindo do território de Lemish, eles desceram um pouco para terem uma visão geral daquela região. Sobrevoaram o Condado de Gaard atravessando o Rio Vigilante. Ainda não podiam ver seu objetivo, pois naquelas terras que acabavam de entrar sempre era noite, assim era chamada de Noturna, o outrora Condado dos Cavaleiros, hoje uma terra maldita dominada pelo mais terrível Cavaleiro da Morte, o Lorde Loren Soth.
Como era sempre noite a vegetação de Noturna era muito diferente do resto de Solamnia. Não havia grama, só pó em um grande campo sem vida. Onde havia apenas uma cadeia de montanhas ao leste, as negras Cordilheiras de Dargaard e suas poucas árvores ao norte, que eram secas e assustadoras. Abutres e corvos voavam naquelas terras, vagueando como as hienas, e talvez coisas piores, no descampado. Quase não havia fontes de luz naquele local amaldiçoado, onde até o ar parecia venenoso e até a chuva era de ácida.
Tão logo chegaram, os estranhos e a dragoa foram recepcionados, ainda nos céus escuros, por uma comitiva, um séquito de treze Guerreiros Esqueletos montados em hediondos Pesadelos Voadores, cavalos negros de ventas e cascos de fogo, capazes de caminhar pelos ares.
Como formavam guarda pessoal do Cavaleiro da Morte, essas criaturas eram armadas como cavaleiros e de fato eram treinadas como tal, pois caíram junto com seu senhor há séculos atrás. Fiéis vassalos de Lorde Soth que o seguiram após sua morte.
Vinham em uma formação de cavalaria conhecida por “ponta de flecha”, no qual consistia em ficarem enfileirados, lado a lado, mas com o meio mais à frente que as pontas, como os pássaros em migração.
Já próximos dos invasores, os guardiões mórbidos de Noturna libertaram suas enferrujadas espadas da bainha e um deles, na dianteira pronunciou:
- Há vós que aqui entrais, deixai para trás toda a esperança!
- Esperem! – disse um dos homens – Eu sou Marhaus, Senhor dos Dragões da Armada Azul, sob o comando de sua suserana; a Alto Lorde Kitiara uth Matar, a Dama Azul e Comandante Suprema de todas as Armadas Dracônicas.
- Somos nós vassalos de algum senhor senão Lorde de Dargaard? – responderam com ironia um dos esqueletos – Estai devir nosso verdadeiro suserano e trará consigo toda sua danação.
- Não! – respondeu Marhaus com alarme – Pela Rainha das Trevas não será preciso! Nós apenas vamos à Última Torre, está em teu território, mas seu senhor não a toma como dele!
- É meu tudo o que há nesta terra, labrego! – Uma voz cavernosa ecoou no ar – Descereis agora!
Olharam para baixo e puderam ver um grande cavaleiro montado no campo deserto, deduzindo que poderia ser o próprio Lorde do Forte Dargaard, eles acharam melhor obedecer. Tão rápido o fizeram e suas suspeitas foram saciadas assim que se aproximaram do chão. Não havia dúvida, era realmente o Lorde Soth.
Era um enorme cavaleiro em uma montaria semelhante a dos seus súditos, mas esta muito maior e de chamas azuis. Tinha uma armadura de tom cinza e muito bem trabalhada cobria o corpo do animal. O homem hediondo portava uma decadente e enegrecida armadura de Solamnia, da ordem dos Cavaleiros das Rosas. Um elmo cobria todo o rosto dele, deixando apenas uma viseira onde só se podia ver duas luzes fúnebres ao invés de olhos. Tinha uma capa suja e desgastada pelo tempo. Possuía como arma apenas uma espada de lamina cruel, em uma das mãos, pois na outra estava uma tocha feita de ossos negros e assustadores que queimavam em um fogo sobrenatural. Uma aura nefanda o cercava que mostrava a Marhaus todo o perigo que aquele horror ancestral representava.
Aquele era um Cavaleiro da Morte, uma das piores criaturas que existiam em toda Ansalon. Eram antigos Cavaleiros de Solamnia que, por cometerem um crime tão terrível, foram amaldiçoados pelos Deuses a vagarem pela eternidade perseguidos pelos seus pecados.
Marhaus desmontou da dragoa e se aproximou com muita cautela, pois sabia que aquele era o mais poderoso de todos os Cavaleiros da Morte e nem sua montaria azul podia fazer frente diante daquela criatura lendária. Com toda a mensura e cerimônia da cavalaria solâmnica que conhecia, o Senhor dos Dragões começou a falar:
- Mil perdões se entrei assim em seus domínios Cavaleiro da Rosa Negra, se o fiz foi porque acreditava que minha Senhora já havia lhe relatado que estaríamos aqui, que não perturbaríamos teu descanso.
- Entrais em minha terra desta forma porquê é, não outra coisa, senão um obtuso.
- Concordo com isso meu lorde. – dizendo isso Marhaus se ajoelhou, mais por medo do que por respeito.
- Sabes que minha espada está banhada em sangue dos mais valorosos cavaleiros que Solamnia já treinou?
- Sim meu lorde. Eu imagino!
- No entanto sempre sou levado a crer que ela, a espada, nunca está completamente satisfeita!
- Por favor, lembre que o senhor tinha um acordo com a Dama Azul.
- Lembro muito bem do acordo! Lembrai a ti que, o que ela me prometera ainda não cumpriu!
Os olhos de Lorde Soth brilharam mais intensamente, como se fosse cometido de uma fúria avassaladora. Devem saber que durante a Guerra da Lança, Kitiara, a Dama Azul, prometera entregar a princesa elfa Laurana para o Cavaleiro da Morte em troca de sua ajuda na guerra, mas ela não cumpriu o acordo. Marhaus sabia disso e, tremendo, entregou um papiro que trazia consigo e, sem encarar a terrível criatura, disse:
- Como símbolo de minha boa vontade trago a ti uma carta de minha Soberana. Ela me pediu para entrega-lo pessoalmente.
O cavaleiro nefando leu a carta na frente dos intrusos e terminando voltou-se novamente para eles dizendo:
- Estais liberados para entrar apenas na Última Torre e que não demores em teu objetivo, pois se me oportunas novamente eu suprimir a sequidão de minha espada com o sangue de um Senhor dos Dragões.
- Compreendo, não demoraremos muito! Tem minha palavra!
- Que não me serves de nada, não? Sir Marhaus!
Pela primeira vez o Senhor dos Dragões olhou diretamente para o cavaleiro maligno. Imaginou como aquela criatura podia saber que ele um dia já foi aspirante a Cavaleiro de Solamnia. Que outrora ele sonhava no dia que seria conhecido como Sir Marhaus e teria seu próprio castelo, que não viveria mais a sombra de seu irmão. Mas o destino havia guardado um caminho muito diferente daquele.
O grande líder da Armada Dracônica Azul se sentiu humilhado, sentiu uma vontade imensa de se bater com Lorde Soth, de desafia-lo, um desejo que só não era maior que o próprio medo que aquele monstro gerava. Entenda que Marhaus de forma alguma era medroso, mas como todos sabem, um Cavaleiro da Morte era um oponente perigoso demais, poderoso demais. Assim ele se levantou, montou novamente a dragoa e em silêncio se pôs a voltar ao seu objetivo original, a Última Torre.



Não foi árduo ou demorado encontrar a Torre. Ela ficava ao sul das montanhas de Dargaard e muito próxima a nascente do Rio Vigilante. Era uma torre negra não muito alta, muito semelhante aos antigos sarcófagos do tempo dos Reis-sacerdotes de Istar. E, de fato, era...
O silêncio é finalmente quebrado pela Dragoa Azul:
- Devo ficar aqui?
- Sim, Tempestade do Deserto! – respondeu Marhaus para a dragoa – Ficará aqui e guardará a jaula que trouxemos, mas você Velthorm virá comigo!
Era comum que os dragões tivessem nomes assim, como Tempestade, Ventania ou Crepúsculo. Essas majestosas criaturas costumavam guardar em segredo seu idioma e seu nome verdadeiro, mas na verdade sua língua era tão estranha que ninguém, senão apenas os seres dracônicos, podiam pronunciar. As outras raças, quando extremamente inteligentes, só podiam entender, mas nunca falar.
O outro companheiro, Velthorm, era um mago, mas não um mago qualquer. Era um Arquimago de Mantos Negros, um dos membros do secreto conclave de Magos de Alta Magia onde estavam reunidos os vinte e um dos maiores magos de Ansalon. Tanto os malignos Magos Mantos Negros, como ele, mas também os benignos Magos Mantos Brancos e os neutros Magos Mantos Vermelhos. Havia também três líderes do conclave, que eram escolhidos um por ordem, de acordo com suas tradições.
Velthorm concordando com Marhaus desmontou e olhou para o céu. Mesmo com a chuva ele podia ver as luas no céu. Podia ver facilmente a argêntea Solinari e a púrpura Lunitari, mas apenas ele, como todo Mago Negro, podia ver a obscura Nuitari. Essas luas eram a manifestação dos Deuses da magia e assim sendo elas influenciavam o poder dos magos.
Todas as luas estavam no céu, mas todas alinhadas da forma que uma eclipsava a outra. Esse raro evento era conhecido como Noite do Olho e aquilo só poderia ser um bom presságio, pensou Velthorm. Então o arcano levantou suas mãos, e gesticulando estranhamente no ar e disse:
- Shirak!
E uma luz se formou na ponta de seu cajado, dentro do crânio, fornecendo uma melhor visão da Última Torre, que para surpresa deles, os portões de entrada estavam tão podres que há muito caíram na escadaria principal. Um ar frio saia da escuridão de interior, algo que os deu calafrios. Tão logo a sensação ruim passou, tanto o comandante e quanto o arquimago, entraram no sarcófago.
Esse era uma torre mais antiga que aqueles homens, tinham estado em toda as suas vidas. Muitos teriam medo de entrar naquele local profano, mas a derrota que os exércitos, agora sob seus comandos, durante a Guerra da Lança fez com que eles tomassem medidas drásticas. Se Kitiara, a Dama Azul, foi privada de trazer Takhisis, a Rainha das Trevas, para Ansalon então eles trariam algo que a ajudaria a se vingar dos Cavaleiros de Solamnia.
Determinados o Arquimago e o Senhor dos Dragões adentraram pelo interior putrefato daquela sombria fortaleza. Guiados pelo livro que Harkiel, a Dragoa Vermelha, lhes dera e, além de conter a planta de vários mausoléus de Istar, como a Última Torre, contava a lenda da criatura nefasta que abita essa fortaleza.
As antigas lendas da Era dos Sonhos falavam de antigos seres que governavam os primeiros povos como deuses. Entretanto não eram deuses e agiam com crueldade aos seus súditos.
Depois de muito tempo grandes heróis, durante o Manifesto da Fé da perdida Istar, foram guiados pelos verdadeiros Deuses e se voltaram contra seus opressores e os baniram do mundo. Depois do Cataclismo, que viria anos depois, quase não sobrou vestígios dessa história.
A Última Torre possui esse nome justamente por isso, pois é o único desses sarcófagos que ainda se tem notícia. Todos os outros se perderam e nem ao menos podemos saber quantos eram. Já que o livro que eles portam não está completo, tem vários mausoléus, mas em detalhes apenas este.
Também estava no livro que esses antigos governantes eram tão poderosos que não podiam simplesmente ser banidos, mas somente presos. Assim os heróis criaram esses sarcófagos, que também é uma prisão aos antigos.
Fracos com todo o combate que ocorreu, os perversos governantes foram presos, mas mesmo assim não derrotados por completo. Eles descansam e esperam poder juntar forças para novamente ameaçar o mundo. Apenas esperando a oportunidade certa, algo que esses malignos visitantes iriam proporcionar.
Não foi difícil entrar nos corredores do interior Torre, ela podia ser bem guardada para a maioria das pessoas, mas seus perigos não eram nada para eles. Afinal, eles também tinham um mapa no livro e sabendo assim, exatamente por onde deveriam caminhar. Assim não demoraram muito para chegar à câmara principal.
Um salão escuro que exalava um ar fétido transmitindo as eras que esse lugar não era habitado por nenhum povo. Havia um túmulo em seu centro, era onde estava o Antigo. Tinha várias obras de arte cobrindo suas paredes, mas o conteúdo das pinturas, já não dava mais para serem vistas. Um grande candelabro de espelhos estava no teto, onde, devido há várias pequenas aberturas nas paredes, devia iluminar toda a câmara com a luz do sol. No entanto, a maldição de Lorde Soth não permitia que os raios do sol tocassem novamente o Condado de Noturna.
O que mais havia ali eram ratos, baratas e todo o tipo de criaturas peçonhentas. Não tinha como andar pelo local sem prestar atenção no chão para não acabar pisando em um dos pequenos animais, mas mesmo assim era inevitável que isso ocorresse uma vez ou outra. Era como se o que havia de mais medonho fosse atraído para aquele lugar.
- Tem certeza que você quer incomodar algo tão antigo que o próprio tempo fez questão de esquecer Meu Senhor? – disse Velthorm, que embora tenha sido a demanda dele, vacilou ao ver o horror do lugar.
- Não me diga que um Arquimago de Alta Magia está com medo!
- Não, claro que não. Estou dizendo apenas que conhecemos quase nada do que vamos libertar! Seria mais prudente...
- Que agora que chegamos quero que prepare o ritual e traga as crianças aqui! – interrompeu Marhaus – Esse foi o único motivo pelo qual permiti que você me acompanhasse, sua única serventia!
Com uma mensura o arcano saiu em busca das crianças que tinha deixado fora da torre para só agora, com todas as armadilhas e perigos destruídos, as traria para o sacrifício, como pedia o livro. Eram elas que estavam na estranha jaula que carregavam, presas, compradas como simples escravas de escravocratas do Chifre Quebrado.
Uma vez que ele trouxe as crianças, Velthorm iniciou o ritual de convocação, como estava descrito no livro. Prendeu as crianças em volta do túmulo que estava no meio do salão. Usou o sangue de animais que havia trazido consigo em uma garrafa e desenhou símbolos antigos e profanos no chão. Pronunciava, enquanto fazia o ritual, de um idioma que há muito tempo o mundo não ouvia, e assim o próprio ar ficava mais pesado.
Enquanto as crianças imploravam por socorro ou misericórdia, sem saber o que estava acontecendo, o Mago de Mantos Negros retirou dois pequenos objetos de seu manto. Cada uma delas parecia uma espécie de presilha ou algo assim. Eram feitas de prata e possuíam inscrições no idioma usado pelos clérigos da Ordem das Estrelas. Entregou um para Marhaus e disse:
- Use isto em seu nariz, o cheiro vai ficar insuportável!
- Certo! – respondeu o Senhor dos Dragões colocando o artefato.
- Isso! Agora vá ao túmulo e o abra.
Hesitante, o comandante fez o que o arcano pediu. Entretanto a tarefa era mais difícil que parecia. O tampão que guardava o Antigo era muito pesado. Ele respirou fundo, tentou esquecer dos berros dos garotos que o incomodava e com muito custo removeu o tampão liberando um fedor horrendo que emanou do túmulo que quase derrubou os dois, mesmo protegidos. As crianças caíram estonteadas pelo odor pútrido.
O grande líder da Armada Dracônica Azul deu vários passos para trás e caiu sentado, mas ainda acordado, sua visão estava turvada e vertiginosa. O Arquimago continuou com o ritual, retirando uma adaga, e sacrificando uma a uma as crianças. Mas não antes de abusar delas das formas mais sórdidas e cruéis, torturando-as sem misericórdia. Depois de mata-las ele pintou o próprio corpo com o sangue delas e se alimentou de seu sangue.
Mesmo Marhaus não agüentou ver aquilo! Vomitou e saiu do salão desejando nunca ter encontrado aquele local. Não havia honra na forma que aquelas inocentes crianças tinham morrido, mas lembrou que era preciso. Tinha que mostrar seu valor para a Dama Azul. Queria mostrar aos Cavaleiros de Solamnia que erraram ao não aceita-lo como um dos seus, ao preferir seu irmão. Tinha que mostrar para ele mesmo que era um homem digno.
Assim ele se levantou e não demorou muito para se recuperar. Virou-se para a porta do salão e entrou. Viu que os corpos sem vida das crianças serem devorados pelos vermes. À medida que eles acabavam seu horrível banquete, as criaturas entravam no túmulo.
Velthorm estava no meio do salão, próximo a lápide e em transe, julgou o Senhor dos Dragões. Ele ainda pronunciava aquelas estranhas palavras, que não ouso traduzir...

“Ashran, ashran pelith Astaroth polhaeim!
Mastrhas erh suphadua qeshua tharty
Posthus pahum sesr vhaur orthovai
Ashran, ashran masfudhir Krynn!
Bos sostos erh xuvhus phollaroin”

Uma luz negra, como se fosse possível uma luz ser negra, saiu do túmulo e aos poucos o Antigo se levantou. Inicialmente envolto pelos vermes que logo se uniram a aquela criatura e que, não era nada além, de um ser magro e fraco, quase patético, enfaixado como as antigas múmias de Istar. Mas tão logo a criatura abriu os olhos e um som, baixo, mas que se propagou por toda Ansalon, o fez finalmente ter a mínima noção do que fizera.
Entenda que não havia bondade nenhuma naquela criatura, todos somos formados de bem e mal, todos menos aquilo, tinha apenas um mal supremo dentro dele. O Antigo provavelmente teria os matado apenas por prazer, mas há muito não habitava Krynn. Sabia disso e precisava deles para conhecer essa época, esse “novo” mundo onde acabara de acordar. Só por isso ele deixaria que aqueles ignorantes vivessem, ao menos por enquanto.
A visão do demônio quase esmigalhou a sanidade de Marhaus que olhando para aquela medonha criatura, colocou suas mãos a própria cabeça e disse:
- O que foi que fizemos!



O forte vento abriu uma das janelas da Alvorada, trazendo um pouco de nevasca para dentro. Todos pararam para olhar o grande Thom fecha-la novamente. O Arauto fez uma pausa, pois sabia que a história era forte demais e seus ouvintes precisavam respirar um pouco. Ele jogou mais fumo em seu cachimbo, acendeu, olhou os rostos ainda abalados de todos e voltou a falar:
- Iniciei minha essa história dessa forma para que percebessem a gravidade da situação. Velthorm estava certo, eles não deveriam ter incomodado aquilo.
- O ritual foi à coisa mais abominável que eu já ouvi! – disse o taverneiro.
- Exatamente! – respondeu o Velho – A criatura só podia ser despertada com dor e sofrimento de inocentes. Aquilo foi tão horrível que perseguiu a mente daqueles homens até que seus destinos se revelassem.
A lareira naquele momento podia aquecer seus corpos, mas não seus espíritos. O Contador de Estórias podia ver isso nos olhos daquele homem, podiam ver a esperança se esvaziar em alguns. Assim, com a taverna limpa da neve que entrou pela janela, o ele retomou seu relato:
- Vou contar-lhes que, mesmo quando um mal tão terrível assola o mundo, ainda há esperança. Sempre há esperança!
- O que pode enfrentar aquilo? – perguntou o grande Thom.
- Irei voltar mais um pouco no tempo, mas não muito! Contarei a história dos heróis que desafiaram o Antigo. Por quem devo começar?
O Arauto olhou para todos, mas especialmente para aquele estranho homem de mantos e cajado. Sorriu para ele e disse:
- Ah, sim! Começarei pelo escudo! Pelo Cavaleiro!

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